A COMUNICAÇÃO IMPLÍCITA E EXPLÍCITA NO FILME: QUASE DEUSES
O filme Quase Deuses narra a história real de Vivien Thomas (1910-1985), afro-americano, afetado pela Grande Depressão dos EUA, que sonhava em ser médico. Após conseguir emprego na Clínica Vanderbilt como faxineiro, começa a estudar os experimentos feitos pelo célebre Dr. Alfred Blalock e logo passa a auxiliá-lo. Autodidata, faz importantes descobertas na medicina juntamente com o Dr. Blalock, resultando na primeira cirurgia cardíaca do mundo. Apesar de sua genialidade, esteve sempre à sombra das aclamações por ser negro, e não conseguiu cursar a medicina, tendo todo seu trabalho reconhecido após receber o tardio prêmio de Doutor Honoris Causa.
O longa-metragem segue duas vertentes interessantes; uma explícita e outra implícita. Expressa a trajetória de Vivian, sua superação, tecnicidade e humildade. Onde o conhecimento adquirido de Thomas, mesmo que informalmente, somada com a exatidão científica do Dr. Blalock torna-se uno, transmitindo a ideia de que o ser humano é dotado da habilidade de aprender e criar.
Toda a experimentação da dupla, às vezes incompreendida, fazia-se necessária para o avanço nas pesquisas médicas. Totalmente laicos, embasados nos resultados das análises com cobaias, geralmente cachorros, foram audazes o suficiente para romper a intangível ciência formada pelos doutores de sua época, quebrando paradigmas em pró de seu objeto de estudo, a saúde do homem. Ainda expõe a tristeza de Vivien dada ao não reconhecimento de seu trabalho e a discriminação racial frequente.
A outra vertente é a demonstração tácita dos fatos históricos onde se ambienta a película. Começando na Grande Depressão, recessão econômica dos EUA no início da década de 30, resultando em altas taxas de desemprego, e queda exorbitante da produção industrial e de renda, resultando no confisco do dinheiro em bancos, motivo pelo qual Vivien perdeu suas economias. Percorre sobre a metodologia usada pela medicina na época, onde não se dispunha de recursos tecnológicos como ferramenta, na busca constante da técnica mais apurada para diagnóstico e cura. Mas o foco implícito deste filme é a narrativa da Segregação Racial, onde naquela época nos EUA, os negros eram discriminados, separados como raça inferior, vivendo numa liberdade escravizada, tratados como escória, marginalizados em tudo, onde não podiam freqüentar ambientes destinados à elite branca, até mesmo dentro das instituições públicas.
O aclive que vai de pequenos gestos quase imperceptíveis, até a manifestação da luta do irmão de Vivien, por igualdade de salário entre professores negros e brancos, dá ao filme um caráter analítico, onde os grandes vilões são a ignorância e a discriminação racial. O filme a grosso modo é informativo, mas sua entrelinha subjetiva uma lição de humanidade, perseverança, superação, luta contra o preconceito racial e quebra das idéias formadas, seja cientifica ou religiosa.
No epílogo, fica clara a mensagem subentendida do filme, quando o sonho de Vivien se torna realidade, recebendo o título de Doutor Honoris Causa. Também se realiza o “eu tenho um sonho” de Martin Luther King (1929-1968), ativista contra o preconceito e a segregação racial, e em trechos de seu discurso enfatiza:
(...) O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons.
(...) Eu tenho um sonho. O sonho de ver meus filhos julgados
por sua personalidade, não pela cor de sua pele. (...). (1963, apud. PENSADOR.INFO, 2008)
Por tudo isso, o filme Quase Deuses é uma obra inteligente, humana, sensível, compassiva e singela que dramatiza a magnífica história de um negro que superou adversidades incríveis em nome de seu sonho.
Por Elizeu Araujo da Cunha
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Título Original: Something the Lord Made
Gênero: Drama
Duração: 110 min.
Ano: EUA - 2004
Distribuição: HBO
Direção: Joseph Sargent
Roteiro: Robert Caswell e Peter Silverman
Ótima análise, gostei muito do filme.
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